ONG fundada por Delúbio Soares usou convênio com o Incra para desviar dinheiro público.
O ex-tesoureiro petista Delúbio Soares foi um dos principais operadores do esquema do mensalão, que deflagrou a maior crise do governo Lula. Expulso do partido. Delúbio e afastou da ribalta política, mas não deixou de pôr em prática o seu maior talento: arrecadar dinlJeiro. O Ministério Público descobriu que uma ONG fundada por ele há 25 anos, o Instituto Nacional de Formação e Assessoria Sindical (Ifas), desviou 3 milhões de reais que deveriam ler sido aplicados em cursos de capacitação de agricultores. O dinheiro foi parar na Federação acional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf), entidade ligada ao MST, especialista em invasões de terra. Pelo que foi apurado, a única aula real ministrada pelo Ifas foi obre como seus integrantes poderiam tungar o dinheiro do contribuinte. A pedagogia da fraude era candidamente registrada em ata. Diz um dos trechos: "Emitir NF (nota fiscal) com valores inferiores a 8000 reais". Em outro, os dirigentes sugerem aos alunos "substituir nota fiscal por recibo".
Por que a necessidade de realizar contratos sem licitação e de trocar notas por recibos? ""Essa é uma tática comum a ONGs corruptas. Sem licitação, o dinheiro é pulverizado em diversas transações, o que dificulta seu rastreamento", explica o procurador Raphael Perissé, responsável por investigar o convênio fraudulento. Esse modus operandi virou praxe durante o governo Lula, que abriu suas arcas para as chamadas organizações do terceiro setor. mesmo em casos com evidências cristalinas de irregularidades. A parceria Ifas-Fetraf é um exemplo bem-acabado. Por sua militância beligerante, a Fetraf está proibida de firmar contratos com o Incra. Com a ONG de Delúbio, o problema foi contornado. "As liberações de dinheiro ocorreram em tempo recorde e sem nenhuma fiscalização", afirma Perissé.
Não é de hoje que ONGs são usadas como fachada para transferir dinheiro público ao MST. Em setembro do ano passado. VEJA revelou a movimentação financeira de quatro entidades que repassaram 43 milhões de reais para patrocinar as ações do movimento. A espantosa quantidade de convênios suspeitos levou à criação de uma CPI no Senado, que acabou abafada pelo governo. Em julho passado, o presidente Lula classificou como "heroica" a atuação da Fetraf. Agora, esses heróis, incluindo Delúbio e o presidente do Incra, Rolf Hackbart, devem ser indiciados pela fraude.
Fonte: Veja - 02/08/2010 - Gustavo Ribeiro
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Grandes Momentos
Qual é o ponto em que uma campanha eleitoral para a Presidência da República passa a ser de baixo nível? Não adianta perguntar aos políticos. pois quase com certeza vão dizer que baixo nível é aquilo que o adversário está fazendo. Mas há diversos sinais razoavelmente seguros para o eleitorado medir a qualidade das campanhas que os candidatos estão lhe servindo - e, felizmente. não se trata de nada que seja muito difícil de perceber ou complicado de entender. Ninguém precisa ter nenhuma dúvida de que o nível desabou, para falar logo no sintoma mais clássico de baixaria, quando os candidatos, ou um que seja, começam a fazer insultos pessoais. A coisa fica feia, igualmente, quando se acusa o adversário por aros que não praticou, ou por estar envolvido em fatos que não aconteceram.
Também não há esperança de compostura quando se constata, por exemplo, que nos porões de certas campanhas há gente montando pastas de documentos com informações, reais ou imaginárias, capazes de prejudicar os competidores - inclusive com dados sigilosos que podem ser desviados, digamos, da Receita Federal. Como regra geral, enfim, e para simplificar o entendimento do que é ou não é jogo sujo, há a questão básica da mentira: se um candidato, sua turma ou sua propaganda mentem, a campanha que fazem foi para a lama. Essa discussão sobre os teores de ética na disputa presidencial tem ocupado boa parte das atenções nos últimos dias, mas, até o momento, produziu muito vapor e pouca energia. O debate foi lançado pelo PT, que acusa a candidatura José Serra de ter arrastado a campanha para o "baixo nível" - a partir do momento em que seu companheiro de chapa, o depurado Índio da Costa. disse que o governo e seu partido dão apoio ao narcotráfico por apoiarem os narcotraficantes das Farc, grupo armado da Colômbia que começou como movimento político e há anos se transformou em organização criminosa. Serra aproveitou para dizer que é isso mesmo e acrescentou seus próprios disparos.
Descreveu a Venezuela e seu coronel Hugo Chávez, que ameaçam mais uma vez ir "à guerra" contra a Colômbia e têm a simpatia aberta do Brasil, como uma ameaça à estabilidade no continente. Acusou o governo brasileiro de nada fazer pelos presos políticos de Cuba deixando a candidata oficial Dilma Rousseff na posiÇão de associada à repressão política cubana. Lembrou, ainda, que Dilma é a preferida dos invasores de terra do MST. É pancadaria grossa e, sem dúvida, uma descarga de agressividade que o PT não está acostumado a receber. Mas a questão-chave, para medir a que altura anda o nível da campanha, não é quem está batendo, ou quem está batendo mais. A pergunta a ser respondida é a seguinte: o que Serra e Índio disseram é mentira ou é verdade?
Os fatos são os fatos. Nem as Farc negam seu envolvimento com o tráfico de drogas - e dos outros crimes que cometem, como seqüestros, roubos e homicídios, chegam até a se orgulhar. Também não é nenhuma novidade, e muito menos um segredo, que o governo brasileiro se recusa a considerar as Farc como uma organização criminosa; a posição do Brasil é que elas são um movimento de "insurreição": com o qual o governo da Colômbia deveria "negociar". As demais agressões que o PT alega ter recebido vão na mesma batida.
Chávez não ofereceu nenhum desmentido sério à acusação de que deixa os traficantes vizinhos utilizarem livremente o território da Venezuela como base de ação, e suas ameaças de começar uma guerra foram feitas em público. Já a candidata oficial, na última vez em que foi perguntada sobre o tema dos direitos humanos em Cuba, respondeu perguntando, ela própria, sobre "os direitos humanos em Guantánamo", a base militar onde o governo americano mantém presos desde 2002, na condição de "combatentes inimigos", suspeitos de terrorismo - como se a situação das liberdades públicas e individuais fosse a mesma em Cuba e nos Estados Unidos. Quanto ao MST, enfim, foi o próprio presidente do movimento, João Pedro Stedile, quem disse em entrevista que "com Dilma poderemos avançar, fazendo mais ocupações".
Conclusão: mentira, nisso tudo, não há nenhuma - e nem o PT diz que tenha havido. Disse apenas, nas palavras de seu presidente, José Eduardo Outra. que Serra adotou um "figurino de direita troglodita". O que conduz a uma questão interessante: se a oposição mal começou a falar e o PT já reage assim, como estará reagindo até o fim da campanha? Pelo jeito, em matéria de nível, grandes momentos nos esperam.
Fonte: Veja - 02/08/2010 - J.R. Guzzo
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Agendas Montadas Sob Medida
Lula comparece a compromissos de governo nos mesmos lugares onde Dilma Rousseff marca seus compromissos eleitorais. O presidente Lula não é candidato. mas tem cumprido uma agenda parecida com a de um. Na última quinta-feira, em Porto Alegre, Lula lançou o edital de duplicação de uma rodovia, assinou a ordem de serviço para o inicio das obras de outra e anunciou a liberação de verbas para a constrUção de casas. Duas horas depois. visitou a maquete da ampliação do Estádio Beira-Rio para a Copa de 2014. Na sequência, foi a Santa Cruz do Sul, no interior do estado. onde participou da comemoração da venda de 30000 tratores financiados pelo governo a pequenos agricultores.
Os eventos. aparentemente pequenos, ainda justificaram o deslocamento de ministros e dezenas de assessores ao Rio Grande do Sul. À noite, depois de encerrado o "expediente", o presidente aproveitou sua passagem pelo extremo sul do país para prestigiar o comício da candidata DUma Rousseff. onde já era aguardado como a principal atração, num estado em que a petista pretende sair da desvantagem que tem nas pesquisas em relação ao adversário, o tucano José Serra. A coincidência geográfica da agenda de serviço do presidente com a agenda eleitoral de sua candidata não é fruto do acaso.
As agendas de Lula e Dilma passaram a ser produzidas em conjunto para que o presidente possa fazer campanha "depois do expediente", um subterfúgio inventado pela assessoria jurídica do Palácio do Planalto para evitar novos problemas com a Justiça Eleitoral, que já lhe aplicou seis multas por uso da máquina e campanha antecipada. A coordenação da campanha petista elegeu os lugares para a realização de comícios estratégicos nos quais a presença de Lula é considerada essencial. Com a agenda eleitoral nas mãos. o gabinete do presidente selecionou os eventos que exigiam a presença de Lula na mesma data e local da caravana petista. A agenda combinada estreou há duas semanas em Pernambuco. Lula esteve em Caetés, no interior do estado, onde lançou um plano de inclusão digital para escolas públicas. Em seguida, percorreu 10 quilômetros de carro por uma estrada vicinal, em direção a Garanhuns, onde se encontrou com Dilma Rousseff em um ato político no qual, entre outras coisas, comparou a petista a Jesus Cristo.
A agenda de Lula é de responsabilidade de seu chefe de gabinete. Gilberto Carvalho, e do chefe de gabinete adjunto. Cezar Alvarez. Desde o início da campanha, os dois têm contato diário com Giles Azevedo, que coordena a agenda de Dilma. São homens de extrema confiança do presidente e da candidata. Os dois lados definem as prioridades da campanha com duas semanas de antecedência e combinam os eventos em que Lula deve tomar pane. A sintonia fina entre governo e campanha é feita pelo ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, e por Antonio Palocci, o mandachuva do comitê de Dilma. Normalmente, as viagens presidenciais são preparadas com antecedência de sete a dez dias. A segurança e o cerimonial da Presidência enviam equipes precursoras. que organizam os roteiros e preparam a programação, tudo com o conhecimento e o apoio dos governante locais. A incursão oficial ao Rio Grande do Sul só foi comunicada ao governo do estado três dias antes do desembarque do presidente da República.
A mobilização para atender aos interesses eleitorais disfarçados de compromissos de governo é tão evidente que Alexandre Padilha passou a convocar reuniões volantes para discutir uma tal "Agenda para um ovo Desenvolvimento Regional". Dos três primeiros encontros do grupo, que reúne políticos, empresários e sindicalistas, dois, por coincidência, foram no mesmo dia e local de comícios de Dilma - em Porto Alegre e no Rio de Janeiro. Os encontros têm servido para justificar o deslocamento do ministro e de funcionários do governo para atos da candidatura petista. No dia seguinte ao do comício gaúcho, na sexta-feira, Lula voou para Foz do Iguaçu, no Paraná, para encontrar-se com o presidente paraguaio Fernando Lugo. Visitou as obras de terraplanagem de uma subestação de Itaipu e vistoriou as instalações de uma futura fábrica de cimento. Tudo cronometrado para que ele tivesse tempo de voar para Curitiba, onde, à noite, depois do expediente, a campanha de Dilma Rousseff o aguardava para mais um comício.
Fonte: Veja - 02/08/2010 - Otávio Cabral
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